segunda-feira, 10 de abril de 2017

Egolatria

Fernando Peixoto

Ela insiste,
     quer que eu me esforce
     e me transforme no que jamais imaginei.
Finge não ouvir o que há tempos segredei.
Realiza expectativas nos meus passos,
     com a pretensão de guiá-los.
Resolve o porvir
     sem sequer conhecer a fragrância do perfume em meu corpo,
     misturado ao meu suor.

Que tempos tacanhos!
Pensamentos estranhos...
Mas não sou um ser virtual,
     tenho carne, sangue, osso e tutano.

Então, deleto meu perfil, e sigo
     à procura de algo mais humano.


Do alto da colina

Fernando Peixoto

Sozinho, desamparado,
miro o horizonte do alto da colina.
É um cenário muitas vezes já descrito...
Uma ave de rapina acaba de passar, lançando seu grito.
E daí? Não quero ler suas vísceras.
Eu já expus as minhas, e não fui correspondido.

Enquanto sofro, me calo;
Enquanto penso, meu falo
adormece e esquece que um dia viveu sem rumo.
Mas eis que quando entrei no prumo,
deu em nada.
Queimei a largada, servi a dose errada...

Por quem já foi, sem antes ter sido.