quarta-feira, 15 de julho de 2015

Dona Nenê e o almoço grátis


Nas redes sociais e em blogs e revistas de simpatizantes de alguma forma ligadas a políticos da elite governante foi possível constatar a “alma lavada” de progressistas (entendo regressistas) como resultado da intervenção de Marieta Severo no programa do apresentador Fausto Silva, que “abrilhanta” as tardes de domingo na TV aberta 1-2. Ao que ele afirmou que o Brasil é “o país da corrupção, o país da crise, o país do desemprego” e, “para muita gente, o país da desesperança”, foi “severamente” corrigido, pois segundo a atriz houve na realidade a inclusão social após o PT deflagrar a dita “luta pela desigualdade”.

Milton Friedman, economista americano ganhador do Prêmio Nobel de Ciências Econômicas em 1976, eternizou o “mito do almoço grátis” que, em suma, defende que ninguém dá nada sem exigir algo em troca ou que não seja pago por outrem 3.

No mesmo diapasão, Margaret Tatcher, em discurso proferido quando ainda era Primeira Ministra do Reino Unido 4, assim destacou:

Não nos esqueçamos nunca desta verdade fundamental: o Estado não tem outra fonte de recursos além do dinheiro que as pessoas ganham por si próprias. Se o Estado deseja gastar mais, ele só pode fazê-lo tomando emprestado sua poupança ou cobrando mais tributos. E não adianta pensar que alguém irá pagar. Esse ‘alguém’ é você. Não existe essa coisa de dinheiro público. Existe apenas o dinheiro dos pagadores de impostos. Por inventarmos mais e mais programas generosos de gastos públicos.

Adeptos do socialismo e sua “ditadura do pensamento único” 5, de viés retrógrado e imprudente como aponta a história (nos países que o adotaram, Marx foi interpretado “direitinho” sim), creem que o Estado, enquanto administrador do patrimônio alheio, deve “pagar a conta” com o dinheiro usurpado da eleita “elite dominante”. E o (convenientemente) engraçado (ou não!) é que muita gente enriquece às expensas do “dinheiro público” e finge não ser parte da “elite”, ocultando a vida nababesca que passou a levar.

Ora, além de incapaz de produzir e lucrar, o Estado é um gestor incompetente nessas paragens; e também não podemos esquecer que a empresa estatal que “produz” dinheiro é de pronto saqueada pelos penduricalhos políticos ali estrategicamente instalados.

Os exemplos são fartos; os esquemas de desvio remontam à criação dessas empresas, mas certamente adquiriram expertise com a ascensão ao poder do lulo-petismo. Além do favorecimento próprio, é dinheiro desviado para agremiações e campanhas políticas, para tocar obras em países dirigidos por ditaduras amigas, para melhorar a sua (deles) infraestrutura, enquanto a nossa está em petição de miséria. Ora, quantos estados da federação possuem metrô, portos ou aeroportos “de último tipo”, como Havana 6 e Caracas 7? Sobra até dinheiro público para emprestar a socialite amiga com restrições de crédito 8.

Voltando. Não houve inclusão social. Houve o pagamento de mesada a famílias e estudantes, muitos cooptados para movimentarem as agendas. Houve a disseminação de um ódio desprezível, que promoveu um racha significativo na sociedade como “nunca antes na história desse país”, para que essa mesma sociedade fosse conquistada mais facilmente, numa clara utilização da antiga tática de guerra “dividir para conquistar”.

E aí entram alguns personagens, como bem descreveu Bruna Luíza, do blog Garotas de Direita, ao lembrar a utilização de artistas pela máquina de propaganda estatal para suprir a falta de inspiração dos confrades que formam a elite intelectual nacional 9:

... onde não há verdadeiros intelectuais, onde cultuam-se diplomas em vez da inteligência, não há referências que sirvam de real exemplo à população. O intelectual de verdade cativa, pois tem ao seu lado a verdade. Ele inspira, e faz com que desejemos alcançar seu conhecimento. E, acima de tudo, ele não está desconectado à realidade e entende que a experiência da humanidade e o legado que recebeu da multidão de sábios que o precederam valem mais do que suas ideias e ideais abstratos. Ele, em suma, respeita a experiência humana. Numa sociedade onde tal exemplo não existe, cria-se um vácuo. Como não há pessoas que trazem aspirações de busca da intelectualidade sadia e do conhecimento, o vácuo é ocupado por quem aparece, por quem se expõe, por quem diz ter as respostas. E é aí que entram os artistas.

Os pseudo-intelectuais brasileiros não conseguem convencer a população, pois sequer acreditam em verdade. Então usam artistas, que não possuem preparo nem arcabouço para opinar em questões político-sociais, mas que de certo modo trazem familiaridade e carisma às idéias que apresentam. É por isso que vemos cotidianamente figuras como Leandra Leal defendendo traficantes, Emicida defendendo ódio racial, Gregório Duvivier criticando a religião, e assim por diante. Tais artistas fogem do que lhes compete, para não simplesmente opinar sobre política, mas para formar opiniões, mesmo sem preparo algum para isso. Recebem respaldo da academia, recebem dinheiro do governo graças à Lei Rouanet, e promovem um relativismo doente, que mina as bases de nossa sociedade. (grifei)

Apesar das vultosas quantias gastas, em especial com propaganda e proselitismo, continuam os problemas com indicadores sociais e econômicos – hospitais, segurança e qualidade do ensino e da mão de obra são sofríveis 10-11. Mas voltando à Marieta Severo, talvez essas “quinquilharias” sejam imperceptíveis para alguém que sempre morou em bairros tradicionais (lugar de rico!) do Rio de Janeiro e de Paris, e frequentou a nata da sociedade.

Chega a ser vexatório presenciar a defesa pública dos que saqueiam o país por liberarem rios de dinheiro para exposição nas mídias, por aqueles que almejam realizar projetos artísticos/pessoais sem se preocupar com o sucesso porque a grana já está no bolso – e o sucesso passa a ser um detalhe. E isso sem contar os parentes e amigos que seguem “na mesma ‘vibe’”.

A “produção” do filme “Chatô, o Rei do Brasil”, por Guilherme Fontes, é apenas um dos muitos investimentos infrutíferos do dinheiro público vivenciados em nosso país 12.

O que é isso? É a captação de dinheiro público pela Lei Rouanet (Lei Federal de Incentivo à Cultura) por artistas consagrados e/ou engajados, autorizada porque fazem proselitismo em entrevistas ou em aparições em público, ou emprestam seu prestígio em showmícios e nas propagandas eleitorais de “suas excelências”.

A última peça de Marieta Severo (Incêndios) – um sucesso graças a seu talento – é patrocinada pelo Banco Itaú, com recursos captados através da Lei Rouanet 13. Porém, nem todo artista consegue incentivo, ao passo em que os agraciados, em quase sua totalidade, já abraçaram o sucesso, são politicamente engajados e coincidentemente estão sempre satisfeitos com o governo e os rumos do país.

Juntando as peças, é certo que alguém sempre paga a conta; e é lógico que não só aqueles membros da classe discriminatoriamente chamada “elite loura e de olhos azuis”. Logo, o povo que paga tributos arca com essa despesa também, e através de muita luta.

Há uma crise institucional e uma crise econômica causada pela incapacidade na gestão somada à tunga deliberadamente produzida nos cofres públicos, que, como se vê, passa ao largo de determinadas pessoas. Mas, repito, isso tem um custo e alguém arca com ele.

Aprenda dona Nenê, e transmita ao Agostinho Carrara: “não existe almoço grátis”!




REFERÊNCIAS


[1] Como exemplo: NOGUEIRA, Kiko. Ao calar o Faustão, Marieta Severo deve ser a próxima global a receber ameaça de morte. Diário do Centro do Mundo, 28/06/2015. Disponível em <http://www.diariodocentrodomundo.com.br/ao-calar-o-faustao-marieta-severo-deve-ser-a-proxima-global-a-receber-ameaca-de-morte-por-kiko-nogueira/>Acesso em 08/07/2015;

[2] Domingão do Faustão, Rede Globo de Televisão. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=obsokR6SYxM>. Acesso em 07/07/2015;

[3] Palestra disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=bSnoOJ0EiOc>. Acesso em 01/07/2015;

[4] Discurso disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=WFIN5VfhSZo&spfreload=10>. Acesso em 01/07/2015;

[5] Expressão cunhada por Flávio Morgenstern. Parem de achar que “reacionário” é ofensa. Disponível em <http://reaconaria.org/blog/arcareaca/parem-de-achar-que-reacionario-e-ofensa/#>. Acesso em 18/06/2015;

[6] PARAGUASSU, Leandra. BNDES financia obra da Odebrecht em Cuba. O Estado de São Paulo, 10/03/2015. Disponível em <http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,bndes-financia-obra-da-odebrecht-em-cuba-imp-,1647693>. Acesso em 08/07/2015;

[7] BNDES apoia com US$ 194 milhões exportações para a Venezuela. Site do BNDES, 06/04/2004. Disponível em <http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/Sala_de_Imprensa/Noticias/2004/20040406_not768.html> Acesso em 10/02/2015;

[8] FABRINI, Fábio. TCU apura empréstimo do Banco do Brasil para Val Marchiori na gestão de Aldemir Bendine. O Estado de São Paulo, 08/02/2015. Disponível em <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,tcu-apura-emprestimo-do-banco-do-brasil-para-val-marchiori-na-gestao-de-aldemir-bendine,1631454> Acesso em 10/02/2015;

[9] LUÍZA, Bruna. A esquerda e os artistas. Publicado no site Reaçonaria, 07/07/2015. Disponível em <https://reaconaria.org/colunas/brunaluiza/a-esquerda-e-os-artistas/> Acesso em 07/07/2015;

[10] Índice que avalia qualidade do Ensino Médio piora em 13 estados. Jornal Bom Dia Brasil, edição de 08/09/2014. Disponível em <http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2014/09/indice-que-avalia-qualidade-do-ensino-medio-piora-em-13-estados.html>. Acesso em 26/02/2015;

[11] Brasil fica em 78º lugar em ranking de qualificação de mão de obra. Veja online – Economia, 13/05/2015. Disponível em <http://veja.abril.com.br/noticia/economia/brasil-fica-em-78-lugar-em-ranking-de-qualificacao-de-mao-de-obra/>. Acesso em 14/05/2015;

[12] Damião, Renato. Guilherme Fontes é condenado a devolver R$ 2,5 milhões captados para o filme “Chatô”. Site da UOL, 25/09/2012. Disponível em <http://cinema.uol.com.br/noticias/redacao/2012/09/25/guilherme-fontes-e-condenado-a-devolver-r-25-milhoes-captados-para-o-filme-chato.htm>. Acesso em 15/07/2015;

[13] Orth Produções. Disponível em <http://www.orthproducoes.com/evento.asp?id=514>. Acesso em 30/06/2015.



Fernando César Borges Peixoto

Advogado, especialista em Direito Público pela Faculdade de Direito de Vila Velha e em Direito Civil e Processual Civil pela Faculdade Cândido Mendes de Vitória.

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