quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Sem água, por favor!


João prometeu a si mesmo que comeria pela última vez aquela gororoba sem sabor, sem “tumpero” na casa de Onofre, o simpaticíssimo amigo de longa data. O caldo do feijão com gosto de água pura, sem sal... Argh!
Ele já havia experimentado algo tão insípido, num dos dias mais sofridos de sua vida (e na sua casa!), quando um boçal que o visitava, querendo se exibir, insistiu para João e sua esposa testarem seus dotes culinários. Dizia o “Jacquin da periferia” que a opinião dos dois, amantes da boa comida muito antes da “onda gourmetizadora” invadir os lares brasileiros, era deveras importante.
Para desgosto do casal, a comida era ruim de doer. Intragável! Havia um inesquecível purê de batatas feito com água, acompanhado de uma bisteca que depois de cozida tomou um banho de água quente para formar o “caldo”. Aquela incursão na cozinha dos pesadelos, que já era um desastre total, conseguiu ter um final ainda pior: o ambiente azedou de vez quando o falso cozinheiro não recebeu os esperados elogios, e danou a soltar piadinhas. Mas o saldo foi positivo: João não teve mais que se submeter àquele tipo de saia justa, já que o idiota desembarcou de mala e cuia de sua vida, para nunca mais dar o ar da (des)graça.
A situação com Onofre era diferente, pois a responsável pela má cocção dos alimentos nobres e exóticos que ele gostava de servir aos amigos, era a cozinheira. E como João estava certo de que o anfitrião preguiçoso tinha conhecimento da falta de dotes culinários da empregada, resolver o contratempo seria simples. Bastaria sugerir a mudança de endereço dos próximos rega-bofes, marcando o almoço das quintas-feiras no Bar do Wilson, que não era um asno, mas um ás no fogão. Wilson os receberia com prazer, e iria prontamente para a cozinha, tirar de letra os desafios culinários.


Fernando César Borges Peixoto

Advogado, niteroiense, metido a escritor, ensaísta, cronista, contista e, de certa forma, um saudosista que agora inventou de escrever poesia.

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