O livro Poder global e religião
universal, do Monsenhor Juan Claudio Sanahuja 1, é um estudo sobre o projeto de poder totalitário
gerado e levado a cabo sob os auspícios da Organização das Nações Unidas (ONU),
que atua em favor da subversão de valores éticos, políticos e religiosos para
promover o surgimento de uma nova sociedade, que será regida por um novo
sistema de valores 2 depois
de efetivados os projetos de reengenharia social que vêm sendo propostos e
implementados (mais rápido que se percebe) em vários países, em especial naqueles
governados por grupos de viés esquerdista, sejam mais radicais, como africanos
e da América Latina, ou light, como socialdemocratas europeus.
Insta salientar que a adesão das esquerdas ao pensamento globalista não
é novidade, conforme já havia lembrado anteriormente 3,
recorrendo à lição de SCRUTON 4,
que
percebeu
a adesão da esquerda à economia global e seus representantes após o suposto
revés sofrido com o colapso da antiga União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS), afirmando que isso contribuiu para uma “sólida mudança de
atitude”. Embora se referisse à Grã-Bretanha, o pensamento globalista adotado
pode ser estendido aos demais países e movimentos de esquerda,
independentemente de sua tonalidade de vermelho. Com efeito:
“Em vez
de atacar o capitalismo global, o Partido Trabalhista passou a ser o seu mais fiel
defensor, promovendo a economia ‘global’ contra os últimos vestígios de
resistência nacional e escarnecendo os reacionários e os ‘Little Englanders’,
que estavam dispostos a sacrificar uma promessa de crescimento econômico ainda
maior em favor dos comprovados benefícios da soberania nacional, das tradições
locais e do direito consuetudinário”.
De outro lado, antes que surja o argumento
“fatality” de que isso é teoria da conspiração, sem o enfrentamento das
questões postas – como se a simples afirmativa (de ser “teoria da conspiração”),
posta de forma desarticulada, fosse irrefutável “per se” –, convém destacar que
inúmeras referências e documentos embasam as informações e teses reveladas no
bojo do livro. Mas a expressão merece reflexão por sua larga utilização e pelo conceito
negativo que a acompanha, sendo crucial a manifestação de CARVALHO sobre tal
argumento falacioso 5:
Não
há,
no jornalismo ou nos debates em
geral, atitude mais indigna, mais abjeta e, no fundo, mais ridícula, do
que tentar impugnar uma denúncia sob o pretexto de que ela é "teoria da
conspiração" (...) a presunção de tudo explicar só pelos fatos mais
visíveis e notórios é, francamente, de uma estupidez sem limites (...). A
proibição de discutir seriamente um assunto importante faz com que dele se
apossem charlatães, malucos e gozadores que (...) dejetam no mercado uma
inesgotável subliteratura com presunções de “história secreta”, alimentando no
público as fantasias mais extraordinárias e atravancando de detritos o caminho
do estudioso sério que busque se orientar nessa selva selvaggia. É a profusão
desses fenômenos que infunde na expressão “teoria da conspiração” uma carga
pejorativa que o termo, por si, não comporta, fazendo dela uma vacina quase
infalível contra a percepção de fatos genuínos e bem comprovados. (grifei)
Como
se vê, a carga pejorativa atribuída à expressão “teoria da conspiração” a
transforma em argumento infalível, “apto” a esvaziar/encerrar
o debate sem que se emita um único pensamento articulado no enfrentamento do
tema em discussão. É possível que haja aí a tentativa de
conduzir à espiral do silêncio, técnica que pretende calar a voz
dissonante, ainda que abundante em fundamento.
Voltando.
No tocante à implementação da reengenharia social, SANAHUJA faz
uma grave acusação 6:
... os
adultos saudáveis e produtivos são os únicos que terão lugar na nova sociedade,
a sociedade da Nova Ordem Mundial (...) os únicos a ter direito a uma atenção
médica de qualidade. Os doentes crônicos, os doentes terminais, os idosos e
todos os que não sejam ou não possam chegar a ser produtivos estarão fora do
sistema. (grifei)
Para dar ideia da veracidade dessas denúncias, uma circunstância
desagradável envolvendo o tema do idoso foi gerada pela fala de Christine Lagarde,
Presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI), repercutindo o conteúdo de documento
que faz parte do Informe sobre a Estabilidade Financeira Mundial, apresentado
em setembro de 2014. Ela afirmou sem o menor constrangimento que as pessoas
estão vivendo em demasiado; que o aumento da longevidade põe em risco a
economia mundial; e que isso requer medidas urgentes 7.
Em seguida, recomendou mudanças no sistema de gerenciamento
dos planos de previdência, com a diminuição das pensões para gerar recursos e o
aumento das contribuições e da idade para a aposentadoria, tudo em nome da
estabilidade financeira. Por fim, acrescentou que caso isso não seja possível,
os países devem cortar os benefícios concedidos, sendo acompanhada por Laura
Kodres, diretora do Departamento de Mercados Monetários e de Capital do FMI,
que alertou que “quanto mais tempo
essas medidas forem ignoradas, mais difícil será de resolver” 8.
Por esse raciocínio, à medida que há o envelhecimento das populações,
um percentual crescente de recursos vai sendo consumido, gerando pressão sobre
os balanços públicos e privados. Sem contar o risco financeiro para os planos
de previdência públicos e privados que oferecem prestações definidas de
aposentadoria – considerados os cálculos atuariais, terão que pagar mais que o
planejado porque as pessoas viverão mais que o esperado. Logo, isso explicaria
a necessidade dessas medidas impopulares que coincidentemente sustentam as
denúncias de SANAHUJA.
Na mesma
toada, o ministro das Finanças do Japão, Sr. Taro Aso, de 72 anos, havia
declarado em janeiro de 2013, durante uma reunião do Conselho Nacional de
Reformas da Segurança Social, que “os
idosos em estado terminal deviam ‘se apressar e morrer’ para poupar
gastos do governo com a saúde pública” (grifei). Na ocasião,
informou que não se submeteria a qualquer tipo de tratamento médico para
prolongar sua vida; que não se sentiria bem sabendo que o tratamento seria pago
pelo governo; e que, por isso, já havia recomendado a membros de sua família
que não permitissem que fosse mantido vivo por aparelhos. Ele ainda teve fôlego
para, “afetuosamente”, chamar os idosos que não conseguem se alimentar sozinhos
de “pessoas tubo” e afirmar
que o tratamento de um único paciente custa ao erário dezenas de milhões de
yenes por mês. O detalhe é que a expectativa de vida no Japão, segundo dados de
2012, é de média de 86,7 anos entre as mulheres e média de 79,4 anos entre os
homens 9.
No subtópico “o novo paradigma de saúde”, SANAHUJA esclarece que esse
novo modelo foi projetado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) “e imposto aos países membros da ONU”. E enfatizando o que afirma, destaca a fala do Sr. Hiroshi Nakajima,
diretor geral da OMS em 1992: “as diferenças
biológicas e genéticas das pessoas podem limitar seu potencial de saúde, e a
saúde é um pré-requisito para o pleno gozo dos demais direitos humanos”. E então, reconhecendo que a atual visão de direito à vida e à saúde
é incompatível com os novos planos, vaticinou: “a
ética judaico-cristã não poderá ser aplicada no futuro” 10.
Esse novo paradigma propõe claramente o descarte de seres
humanos através do incentivo à eutanásia e ao aborto 11. Apenas os seres saudáveis e produtivos terão direito
à atenção médica de qualidade, sendo jogados à margem do sistema os doentes
crônicos/terminais e os idosos. Esses planos seguirão adiante até a eliminação
da ética criada pela civilização ocidental. Como exemplos dessa prática, SANAHUJA
aponta o Obamacare, sistema de saúde proposto pelo presidente dos Estados
Unidos, que inclui 12:
a) o aborto sem restrições financiado com fundos
públicos; b) a eutanásia disfarçada, por meio da limitação de consultas
médicas, medicamentos e cuidados necessários para doentes crônicos, desde
crianças com síndrome de Down até doentes de câncer, assim como para os idosos
e veteranos de guerra; c) a negação do direito à objeção de consciência aos
profissionais de saúde que não queiram envolver-se nessas práticas; d) um
controle quase exclusivo por parte do governo quanto às apólices de seguro de
saúde, criando um Comitê de saúde que pode tomar decisões sobre os pacientes e
que atribui ao governo federal o poder de vigiar contas bancárias pessoais para
averiguar os gastos em saúde de cada cidadão.
Vindo para a realidade brasileira, o que me levou a escrever esse
artigo foi a notícia de que a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª
Região (TRF-5R) autorizou a Caixa Econômica Federal (CEF) a negar a contratação
de determinada modalidade de seguro de vida a idosos com mais de 70 anos 13.
Consta da notícia que, após afirmar que o tribunal prestigiou a
autonomia de vontade da seguradora em seu direito de “selecionar os riscos que entende seguráveis”, o advogado da CEF afirmou que a decisão:
Também
merece aplauso por reconhecer que esta seleção passa necessariamente por exame
da pessoa do segurado, seus hábitos, estado de saúde, sexo e idade,
não sendo este fator de seleção e individualização, por si só, fator de
discriminação contratual. Ao contrário, é a essência da própria atividade
securitária e comutatividade contratual. (grifei)
Vamos aos fatos.
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou Ação Civil Pública (ACP) objetivando
que a Caixa Seguradora S.A. se abstivesse de incluir cláusulas abusivas que
restringissem a contratação do seguro de vida “Caixa Seguro Amparo” por idosos de
mais de 70 anos, por ferir os princípios da dignidade da pessoa humana e da não
discriminação.
Porém, o julgado, aprovado à unanimidade, destacou que não há empecilho
à limitação da idade para contratar seguro de vida em grupo, não existindo discriminação
contra o idoso nem abusividade da cláusula que restringe o grupo de seguráveis.
Segundo o voto condutor 14,
que adotou parecer do MPF na 2ª instância, a limitação de idade é cabível e
resulta da própria natureza do negócio; e a proposta da seguradora era clara
quanto à limitação de idade. Ademais, o prêmio é fixado com base em cálculos atuariais,
que consideram a probabilidade de ocorrerem os riscos aos quais os contratantes
podem se submeter, e fatores como estado de saúde e idade etc. E como quem
ultrapassa os 70 anos está mais exposto
a riscos de doenças e mais próximo da morte, não é correto constranger os
outros segurados do plano em grupo a pagarem valores mais altos em razão do
desequilíbrio causado pela inclusão de pessoas cuja situação de risco é mais
agravada, ainda mais porque poderiam aderir a outras modalidades individuais de
plano, adaptáveis à sua realidade, disponibilizadas pela empresa.
Daí, a Turma concluiu pela faculdade de contratar em razão do princípio
da legalidade 15 e da inexistência
de norma a impor à seguradora o dever compulsório de contratar, independentemente
do perfil do consumidor, até porque norma técnica da SUSEP admite que
determinada seguradora não aceite “... segurado acima de determinada idade, da
mesma forma que outra pode desejar não aceitar segurados que possuem profissões
de maior risco, como, por exemplo, vigilantes ou motoboys. Nos dois casos as
seguradoras estariam apenas trabalhando para adequar suas carteiras ao
direcionamento definido pela alta administração da empresa” 16.
Cabe, porém, questionar a decisão, que dá resposta generalizada sem abordar as várias situações distintas de
segurados, mormente em relação ao período de tempo em que foi mantida a relação
contratual. Foi feita a justiça, mesmo em se tratando de um contrato aleatório?
Por que com 69 anos o contrato pode ser firmado e não com 70 anos? Por que não
estabelecer um aumento escalonado de forma razoável, como se faz nos contratos
de planos e seguros de saúde?
Segurados a partir dos 60 anos deveriam ver respeitado o decênio
preconizado no Estatuto do Idoso para o plano de saúde, já que o plano de saúde
é regulado pela Lei nº 9.656/1998, que o STJ aplica por analogia nos julgados
sobre seguro de vida 17.
Simplesmente negar caracteriza um ato discriminatório.
Vale acrescentar que pesquisa recente do IBGE, divulgada em dezembro de
2014, apurou que a expectativa de vida do brasileiro passou para 74,9 anos 18. Então, se for para negar
direitos, que o seja a partir do fim da expectativa de vida, o que quer dizer
que até esse dia de vida deveria ser assegurado ao idoso o direito de contratar
o seguro de vida. Ao menos seria mais coerente.
Há também recente artigo publicado no portal JusNavigandi, que informa
que o TRF-4R, conformando entendimento anterior, negou a um portador de
neoplasia maligna que iniciou o tratamento em hospital particular o direito de
postular o medicamento perante o Sistema único
de Saúde (SUS) 19,
conforme é possível verificar no seguinte trecho da decisão 20:
a Rede de Atenção Oncológica está formada por
estabelecimentos de saúde habilitados como Unidade de Assistência de Alta
Complexidade em Oncologia (UNACON) ou como Centro de Assistência de Alta Complexidade
em Oncologia (CACON). Os hospitais habilitados como UNACON ou CACON devem
oferecer assistência especializada ao paciente com câncer, atuando no
diagnóstico e tratamento. Essa assistência abrange sete modalidades integradas:
diagnóstico, cirurgia oncológica, radioterapia, quimioterapia (oncologia clínica,
hematologia e oncologia pediátrica), medidas de suporte, reabilitação e
cuidados paliativos. Em casos de medicamento para neoplasia, não se submetendo,
o postulante, a tratamento perante um CACON ou UNACON, inviável que exija
destes apenas o fornecimento do medicamento.
Com efeito, a legislação submete o doente portador de neoplasia maligna
a realizar o tratamento oncológico na rede pública (SUS) se quiser receber o
medicamento necessário. Segundo a Portaria nº 876/2013, do Ministério da Saúde,
que regulamenta a Lei nº 12.732/2012, que trata do primeiro tratamento de
paciente com neoplasia maligna comprovada, o Ministério da Saúde irá “garantir o financiamento
para o tratamento do câncer, nos moldes das pactuações vigentes, de acordo com
as suas responsabilidades” (artigo 8º, inciso II). Todavia, o
cliente que faz o tratamento em instituição privada não irá receber o remédio
indispensável a sua recuperação, nem fará jus à tutela jurisdicional que assegure
tal garantia.
Algo muito importante a ser considerado é que a presidente Dilma Roussef
e seu antecessor, Lula da Silva, acometidos de problemas oncológicos, foram se
submeter a tratamento em rede privada, no melhor hospital do país, tudo custeado
pelo povo brasileiro.
Atitudes como as apontadas acima
servem para demonstrar que a criação do Estatuto do Idoso e a previsão e
extensão de “direitos humanos” do idoso no Plano
Nacional de Direitos Humanos (PNDH)
em todas as suas versões não passam de balela.
Devemos estar cientes de que direitos humanos é expressão que soa
melíflua nas bocas progressistas, mas sem perder a noção de que não existem investidas
para a sua efetiva concretização, mormente nos níveis das promessas. Com
efeito, trata-se de coisa de camaleão, que com a cabeça diz que sim, e com o
rabo diz que não, pois a saúde, a previdência e as atividades e garantias
reconhecidas aos idosos (como ao resto da população) são vergonhosamente
negligenciadas pelo próprio Estado, que a bem da verdade só encara o
cumprimento do “pacto” pela parte de contribuintes e de empresas.
Nessa toada,
GARSCHAGEN 21 atenta para
um péssimo costume do político brasileiro, de elaborar “projetos” visando à
criação e à majoração de tributos para estabelecer benesses e fomentar direitos
básicos em favor da população, mas que, na realidade, jamais se realiza, e
serve apenas para aumentar a arrecadação, já que o Estado possui um famigerado
apetite e segue em contínuo inchaço:
Perante uma sociedade sob pressão, e deslocando o
diálogo para os seus próprios termos, os membros do governo criam armadilhas
para justificar as próprias decisões políticas, aparentemente benéficas para o
povo, mas que, na verdade, os favorecem. Não será surpresa, portanto, o mau
resultado produzido pela aplicação de ideias maléficas.
Isso acontece quando os políticos dizem que é preciso
aumentar ou criar mais impostos para melhorar ou ampliar os serviços públicos
(saúde, ensino etc.). Dessa forma, evitam a discussão sobre o papel do governo,
sobre a moralidade dos tributos, sobre o volume da cobrança atual, sobre a
impossibilidade de um poder político cumprir tais promessas em larga escala.
O debate é, assim, direcionado ao percentual de aumento
e ao que o governo pode e deve fazer, não ao que é relevante, ou seja, aquilo
que o governo não deve fazer e o que não devemos compulsoriamente financiar. No
fim, somos ludibriados para que seja preservada a situação legal em que somos
obrigados a pagar mais por aquilo que decididamente não recebemos, nem
receberemos (saúde, ensino, segurança, aposentadoria etc.).
Ou seja, o Estado sempre que se
encontra descapitalizado manda a conta para a população, ao argumento de que
proporcionará melhorias que jamais serão sentidas.
Finalmente, para refletir sobre a questão
da velhice e da doença nessa nova sociedade pensada para atender à nova ordem
mundial, vale à pena recorrer a um clássico futurista, que narra uma distopia.
Em certo trecho do livro Admirável Mundo
Novo 22, de Aldous Huxley,
o
Diretor de Incubação e Condicionamento (D.I.C.) se dirigiu a estudantes que dali
a um tempo iriam trabalhar no Centro de Incubação e Condicionamento de Londres
Central, para informar como eram as coisas antes e depois de “Sua Fordeza”, o
visionário que idealizara aquele mundo novo. Contou da necessidade de destruir museus e
monumentos históricos, do esquecimento forçado de intelectuais como Shakespeare
e do fim do cristianismo. Falou das vantagens de uma educação verdadeiramente
científica; e ainda informou que no passado pessoas bebiam e usavam morfina e
cocaína, que causavam efeitos ruins. Então, “dois mil farmacologistas
e bioquímicos foram subvencionados pelo Estado” para criar
a droga perfeita, a “soma”, que ajudou a assegurar a estabilidade da sociedade
e não causava mal-estar. Também lembrou que mesmo diante de tantos avanços,
faltava “vencer a velhice”, o que foi alcançado com a utilização de várias
drogas e técnicas: “hormônios gonadais, a transfusão de
sangue jovem, os sais de magnésio...” –, até que “todos os estigmas
fisiológicos da velhice foram suprimidos. E com eles, naturalmente... (...).
Com eles, todas as peculiaridades mentais do velho. O caráter permanece
constante por toda a vida”. Ao final, comparou a vida passada com a atual
23:
- No
trabalho, nas diversões – aos sessenta anos, nossas forças e nossos gostos são
o que eram aos dezessete. Os velhos nos tristes dias de outrora, renunciavam,
retiravam-se, dedicavam-se à religião, passavam o tempo lendo e pensando – pensando!
(...)
- Atualmente, tal é o progresso, os velhos trabalham, os
velhos copulam, os velhos não têm um instante, um momento de ócio para furtar
ao prazer, nem um minuto para se sentarem a pensar – ou se, alguma vez, por um
acaso infeliz, um abismo de tempo se abrir na substância sólida de suas
distrações, sempre haverá o soma, o
delicioso soma...
Como
se vê, pensar era evitado, e qualquer “distração” que levasse alguém a se
inquietar com aquele vida robótica (inclusive para questionar o sistema) seria
reparada com a utilização da droga.
Para entender bem a denúncia de Huxley, alguém muito bem informado em
sua época, veja o diálogo entre os personagens Bernard e Lenina, ao se
encontrarem num lugar cujos habitantes viviam fora do “mundo novo”, e por isso
eram chamados selvagens 24:
- Oh! –
Ela agarrou-se no braço de Bernard. - Olhe!
Um
índio quase nu descia muito vagarosamente a escadinha do terraço do primeiro
andar de uma casa ali perto – um degrau após o outro, com a cautela trêmula da
extrema velhice. Seu rosto estava encarquilhado e negro como uma máscara de
obsidiana. A boca, sem dentes, era chupada. Nos cantos dos lábios, e de cada
lado do queixo, luziam alguns pêlos espetados, quase brancos contra a pele
escura. Os cabelos compridos, não trançados, caíam-lhe em madeixas grisalhas
pelo rosto. O corpo era curvado e tão magro que parecia não ter quase mais
carne sobre os ossos. Muito devagar ele descia, parando em cada degrau antes de
arriscar outro passo.
- O
que é que ele tem? - sussurrou Lenina. Estava com os olhos arregalados de
horror e espanto.
- Ele
é velho, simplesmente - respondeu Bernard, com toda a indiferença que lhe foi
possível aparentar. Estava também sobressaltado, mas fez um esforço para se
mostrar imperturbável.
-
Velho? - repetiu ela. - Mas o Diretor é velho, e há uma porção de gente que é
velha, e no entanto não são assim.
- É
porque não deixamos que fiquem assim. Nós os preservamos de doenças,
mantemos artificialmente as secreções internas ao nível de equilíbrio da
juventude. Não deixamos cair a taxa de magnésio e o cálcio abaixo do que era
aos trinta anos. Fazemos transfusões de sangue jovem. Mantemos o metabolismo
estimulado permanentemente.
Por
isso, sem dúvida, eles não têm esse aspecto. Em parte – acrescentou – também
porque a maioria morre antes de atingir a idade daquele velho. A juventude
quase intata até os sessenta anos, e depois, zás! O fim. (grifei)
Para concluir, é possível perceber
que tanto realidade quanto ficção caminham de encontro à adoção de uma
civilização “perfeita”: saudável, apascentada, feliz, produtiva e jovem. E
isso, certamente, vai para a conta de alguém, pois há políticos e fanáticos
envolvidos. Aliás, há o ser humano envolvido.
Num primeiro momento é forte a vontade de tratar um tema tão
perturbador como teoria da conspiração. É mais fácil, prático. Pensar o
contrário leva a considerar que muita gente, há muitos anos, está mancomunada
num propósito de alienação e domínio do homem, algo perigoso e surreal – e
muita gente sente preguiça só em pensar nisso. Contudo, teimosamente as
evidências estão aí. E não só HUXLEY, mas também George Orwell, no
livro 1984, há tempos denunciaram. Há vários Comitês, Painéis e medidas no âmbito
global, intragovernamental e doméstico que teimosamente insistem em caminhar
“pari passu” com essas denúncias, como as feitas por SANAHUJA.
No plano real, palpável, apesar de tanto se falar em direitos humanos,
vemos que muitas resoluções e decisões são no sentido de desprestigiar os
idosos e os doentes, bem como evitar o nascimento de “pessoas indesejadas”
(geralmente filhos de pobres). O discurso torna-se vazio ante a realidade
cortante da negativa de direitos que não deveriam ser sonegados, ainda mais com
justificativas tão absurdas. É triste ver autoridades de organismos
internacionais com intensões escusas lançando mão de discursos tão discriminatórios,
contando com o endosso de autoridades locais, como o ministro japonês ou julgadores
brasileiros, acompanhados de nossos legisladores, que, entre tantas ações
menores, lançam pegadinhas para negar o tratamento de doenças tão sérias e
cruéis.
Também é importante salientar que enquanto a medicina e talvez a
farmacologia avançam para dar mais qualidade de vida e longevidade ao ser
humano, os governos parecem fazer de tudo no sentido contrário. O número de
pessoas que apresentam doenças degenerativas é enorme. O câncer se transformou
numa doença tão banal que ninguém teme dizer seu nome, como faziam os antigos
ao chamá-lo de “doença ruim”. Em recente entrevista, Lair Ribeiro, médico
cardiologista e nutrólogo, afirmou os males causados, com a bênção estatal,
pelo brometo contido no pão francês, pelo cloro contido na água de beber e das
piscinas e pela exposição da população ao flúor nas pastas de dente, além de
lembrar que 5 nutrientes importantíssimos faltam aos brasileiros: Vitamina D,
Iodo, Cálcio, Ômega 3 e Magnésio 25.
Cadê a preocupação das autoridades e dos profissionais da saúde ligados
ao Estado? Um trabalho bem feito poderia prevenir muitos males, mas parece que
não é desejado.
A agenda vai sendo tocada. Firme e forte, vão sendo retirados aos
poucos os direitos através de subterfúgios como aquele do tratamento de câncer.
Com efeito, com a adoção de práticas progressistas que advogam o dinamismo do
Direito, não raro encontramos soluções que vão transformando o conteúdo e o
sentido de leis para invariavelmente prejudicar, ora tirando dinheiro do
contribuinte para assegurar direitos que nunca chegarão, ora para impor e
cobrar o cumprimento de requisitos criados com a finalidade de exclusão,
criando dificuldades para vender (mas não entregar) facilidades. Tudo isso não
sem contar com o auxílio luxuoso do Judiciário e do Ministério Público.
Quem viver verá! E desde já deve pedir ao seu poder superior que o
garanta com saúde e produtivo, inclusive na velhice, para não ser “expelido”
pelo sistema.
Notas
1 Sanahuja,
Juan Claudio. Poder global e religião universal.
Campinas: Ecclesiae, 2012;
2 Atualmente diz-se que tais
valores são determinados pela civilização ocidental (ou cultura judaico-cristã,
ou eurocêntrica);
3 PEIXOTO, Fernando César Borges. Comentário sobre o domínio da semântica
como instrumento revolucionário. Disponível em <http://fernandopeixoto-es.blogspot.com.br/2015/08/comentario-sobre-o-dominio-da-semantica.html>. Acesso em 27/08/2015;
4 SCRUTON, Roger. O que é conservadorismo. São Paulo: É
Realizações, 2015, p.
31;
5 Carvalho,
Olavo de. Falsos segredos. Diário do Comércio, 14/01/2010. Disponível em <http://www.olavodecarvalho.org/semana/100114dc.html>. Acesso em 28/07/2015;
6 SANAHUJA, Juan Claudio. Ob. cit.,
p. 32;
7 O FMI propón recortar as pensións polo
envellecemento da poboación. Fundación
para la Defesa de los Consumidores. Santiago de Compostela (Galícia/ES),
12/04/2015. Disponível
em <http://fundeco.info/fundeco/content/view/4705/>. Acesso em
21/07/2015;
8 VICESA, Daniel. Los
ancianos viven demasiado y es un riesgo para la economía global, hay que hacer
algo ya. Disponível
em <http://victoriadelaluzsazo.blogspot.com.br/2014/09/christine-lagarde-fmi-los-ancianos.html>. Acesso em
13/07/2015;
9 Ministro japonês de
72 anos diz que idosos devem se “apressar e morrer”. Globo.com, 22/01/2013. Disponível em
<http://oglobo.globo.com/mundo/ministro-japones-de-72-anos-diz-que-idosos-devem-se-apressar-morrer-7365724>. Acesso em 21/07/2015;
10 SANAHUJA, Juan Claudio. Ob. cit.,
Capítulo 2: Os novos paradigmas éticos, Título II: O novo paradigma de saúde,
págs. 32-34;
11 No caso do aborto, esse descarte
é mascarado como resposta à questão do filho indesejado ou com problemas na
saúde física ou mental;
12 SANAHUJA, Juan Claudio. Ob. cit., págs. 33-34;
13 Rover,
Tadeu. Seguradora pode limitar contrato
de seguro pelo critério de idade. Revista Consultor Jurídico de 21/03/2015.
Disponível em <http://www.conjur.com.br/2015-mar-21/seguradora-limitar-contrato-seguro-criterio-idade>. Acesso em 07/07/2015;
14 TRF-5R, APELREEX
0003102-45.2012.4.05.8500/SE, 1ª Turma, Rel. Des. Fed. Manoel de Oliveira
Erhardt;
15 Artigo 5º, inciso II, da CF/1988:
“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
de lei”;
16 Artigo 64, §2º, da Portaria nº 302/2005:
“Caso a sociedade seguradora não tenha interesse em renovar a apólice, deverá
comunicar aos segurados e ao estipulante mediante aviso prévio de, no mínimo,
sessenta dias que antecedam o final de vigência da apólice”;
17 Como exemplo: REsp 1.376.550/RS, Rel. Min. Moura
Ribeiro, 3ª Turma, DJe de 12/05/2015; e
AgRg no REsp 1.327.491/RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma,
DJe de 28/11/2014;
18 Expectativa de vida dos brasileiros sobe
para 74,9 anos, de acordo com IBGE. Portal Brasil, 01/12/2014. Disponível
em <http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2014/12/expectativa-de-vida-dos-brasileiros-sobe-para-74-9-anos-de-acordo-com-ibge>. Acesso em
13/07/2015;
19 Rocha, Thiago dos Santos. Paciente oncológico que operou em hospital
particular tem direito a medicações pelo SUS? Disponível em <http://jus.com.br/artigos/38076/paciente-oncologico-que-operou-em-hospital-particular-tem-direito-a-medicacoes-pelo-sus?utm_source=boletim-diario&utm_medium=newsletter&utm_content=titulo&utm_campaign=boletim-diario_2015-08-04#>. Acesso em 06/08/2015;
20 TRF-4, Apel. Cível 5070356-06.2012.404.7100/RS, Rel. Des. Federal Vivian
Josete Pantaleão Caminha, 4ª Turma, DJE de 02/07/2014;
21 GARSCHAGEN, Bruno. Pare de acreditar no governo... Rio de
Janeiro: Record, 2015, págs; 65-66;
22 HUXLEY, Aldous. Admirável mundo novo. 5. ed. Porto
Alegre: Ed. Globo, 1979, págs. 9-36. Disponível em http://livrosdamara.pbwiki.com.br. Acesso em
21/02/2015;
23 HUXLEY, Aldous. Ob.
cit., p. 36;
24 HUXLEY, Aldous. Ob.
cit., p. 66;
25 Entrevistando o Dr.
Lair Ribeiro – Os alimentos que fazem bem e mal para a saúde. Horizonte Revelado, 24/06/2014.
Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=-ovy7ZoRTyM>. Acesso em 28/07/2015.
25 Entrevistando o Dr.
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Referências
CARVALHO, Olavo de. Falsos
segredos. Diário do Comércio, 14/01/2010. Disponível em
<http://www.olavodecarvalho.org/semana/100114dc.html>. Acesso em
28/07/2015.
GARSCHAGEN, Bruno. Pare de
acreditar no governo... Rio de Janeiro: Record, 2015.
HUXLEY, Aldous. Admirável mundo
novo. 5. ed. Porto Alegre: Ed. Globo, 1979. Disponível em http://livrosdamara.pbwiki.com.br.
Acesso em 21/02/2015.
PEIXOTO, Fernando César Borges. Comentário
sobre o domínio da semântica como instrumento revolucionário. Disponível em
<http://fernandopeixoto-es.blogspot.com.br/2015/08/comentario-sobre-o-dominio-da-semantica.html>.
Acesso em 27/08/2015.
SANAHUJA, Juan Claudio. Poder
global e religião universal. Campinas: Ecclesiae, 2012.
SCRUTON, Roger. O que é
conservadorismo. São Paulo: É Realizações, 2015.
Fernando César Borges Peixoto
Advogado, especialista em Direito Público pela Faculdade de Direito de Vila Velha e em Direito Civil e Processual Civil pela Faculdade Cândido Mendes de Vitória.
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